Já há alguns anos, passo o mês de janeiro na praia e desde o começo do ano estava dando um tempo de tudo ao meu redor. Fora isso, me perguntava, em meio a caminhadas, o que seria novidade neste 2011 para a cidade e para mim mesmo, lembrando que ainda teremos que suportar Micarla (teremos?) por esses anos.
Claro que este questionamento traz uma ansiedade envolta entre a mesmice que às vezes inunda Natal, as tacanhas ações que surgem das indi(gestões) públicas e o despertar de alguns lançamentos de livros, exposições, blogs, sites e projetos realmente profissionais e legais que afloram durante o ano dentre muitas coisas que precisam melhorar. Mas o amadurecimento segue esse percurso, não é mesmo?
Domingo, 01 de maio, fui ao Circuito Cultural Ribeira e respirei como há tempos não fazia em Natal. Senti esse Circuito em seus vários espaços de ação como o melhor até agora e se Deus quiser, muitos hão de vir!
Entre tudo o que vivi lá, finalmente fui desperto nos meus olhos para a instalação “A sinceridade pode deixar marcas maiores”, de Ramilla Souza, que aconteceu na sede dos Atores à Deriva, com base em frases que nos aludem a desabafos, a confissões e a desejos nem sempre revelados. Ramilla apresentou um consciente/inconsciente sexual que existe baseada no trabalho de Trevor Brown, artista inglês que mora no Japão.

Para mim importa muito esse mergulho nas profundezas que ocultamos. E embora muitos venham falar sobre uma questão de ética, valores morais, de justiça, de politicamente correto, de transtornos ou sei lá de quê enrustido na hipocrisia da cidade (como foi a pseudo celeuma sem um debate conceitual em torno da ótima performance de Pedro Costa quando ele retirou um terço do anús, no Salão de Artes Visuais de Natal em 2010), é preciso entender que a arte contemporânea existe para questionar os significados das coisas ou mesmo para resignificar os sentidos. Há o simples fato de que o artista levanta as velas de si mesmo para transformar-se (e ao outro) a partir de seus envolvimentos consigo e com o mundo.
Por isso, antes de tudo, só consigo me sentir tomado pela verdade interna capaz de me fazer crescer o desabar nos meus abismos e no encanto de encontrar realidades alheias que me comovem. Antes de tudo isso, só consigo lembrar-me que silêncio velado só favorece a incompreensão de si e daquele que me olha. É por isso que o mundo anda tão infestado de seres mal resolvidos com sua própria sexualidade, com o lidar com a diferença; repletos de desconfiança e descrédito em si mesmos e no mundo. É a ignorância no sentido de criar discursos e julgamentos estéreis, além das intrigas vazias (corroendo o natural individual que é repleto de singularidade) que tem o efeito de minar potenciais humanos. E quando me deparo com uma artista como Ramilla – investigando seus horizontes internos – que acredito novamente no poder libertador que a arte tem.
*Jean Sartief é artista visual e poeta, poeta e artista visual. Lançou, ano passado, o livro de poemas O mar sou eu.
Texto publicado originalmente na Revista Catorze de Jornalismo Cultural
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